segunda-feira, 22 de abril de 2013

RELATÓRIO #1– Títulos do Portal R7 – Destaques e Mais Lidas



            De acordo com Jorge Pedro Sousa na obra “Elementos de Jornalismo Impresso”, o exercício do jornalismo deve atender a uma gama de exigências pragmáticas e objetivas: “Exige elevados conhecimentos e uma boa cultura geral. Exige atenção à actualidade, domínio dos assuntos e discernimento para distinguir o essencial do acessório. (...)Exige capacidade de obtenção de informação credível, em documentos, junto de fontes de informação, na Internet.” (p. 36). Publicados em 2001, os elementos exibidos por Sousa apontam para um distanciamento entre o formato da apuração e estruturação do conteúdo e enquadramentos do texto vinculado à mídia impressa com aquele existente no universo online.

            Nesse sentido, ao analisarmos a dinâmica e a estruturação do objeto da nossa pesquisa - comparações entre os “Destaques” e as matérias “Mais lidas” do Portal R7 – constatamos que os principais valores notícias e critérios de noticiabilidade empregados pelo portal não correspondem às exigências salientadas por Sousa. Embasadas em torno dos critérios da imprevisibilidade e da negatividade, a linha editorial do Portal sustenta-se, principalmente, na abordagem do espetáculo, do grotesco e da esfera privada de celebridades.  Esses elementos são formatados em notas e breves notícias nas quais há preferência pelo uso da imagem e por hiperlinks, cuja construção de sentido distancia-se da necessidade de se explorar elementos da atualidade com cautela e prezando-se pela apuração cautelosa proposta pelo Manual de Sousa. Utilizando-se de títulos nos quais há o desejo de se atrair o leitor rapidamente pelo campo da sensação e do inusitado, o portal apresenta, ainda, algumas disjunções entre o assunto apresentado na chamada e aquele realmente trabalho pelo texto da matéria.

            Um dos episódios graves dessa diferença pode ser exemplificado com um dos “Destaques” apontados pelo portal no dia 19 de abril (sexta-feira) às 10h da manhã: “Menino com distrofia muscular realiza sonho de brincar fora da cadeira de rodas. Veja as imagens”. Situado no subsetor “Saúde” do portal, o título era acompanhado do índice “Comovente” e abria o seguinte texto: “O fotógrafo MatejPelijhan conseguiu transformar em realidade os sonhos de Luka, um garotinho de 12 anos que sofre de distrofia muscular- uma doença degenerativa irreversível que enfraquece os músculos e priva o menino de correr, pular e andar”. Ao se analisar os termos “realiza sonho” e “conseguiu transformar em realidade os sonhos de Luka” – referentes, respectivamente, ao título e ao texto da matéria -, é possível pensar em alguma ação promovida pelo fotógrafo em prol da recuperação da saúde e da força física do garoto em prol da recuperação do domínio dos seus membros e a consequente possibilidade de realização de movimentos e atividades físicas. Não obstante, ao se observar as imagens – veja abaixo -, percebe-se que o fotógrafo realizou um ensaio fotográfico cujos ângulos promoveram a simulação de situações nas quais o garoto aparentava estar participando de brincadeiras e situações nas quais é necessária a presença de músculos e membros saudáveis. Dessa maneira, ao optar pelo emprego do valor notícia principal de “dramatização”, o portal exerceu o trabalho jornalístico de forma superficial e apelando para a comoção do leitor. 



Outro exemplo no qual o título pode levar à outa interpretação que não aquela explicitada no texto da matéria, é esse encontrado também no campo de “Destaques” na tarde do dia 18 de abril (quinta-feira), às 15h35: “Acusada de abusar de aluna de sete anos, professora diz que não gosta de negras”. A afirmação de que a professora não gosta de negras e a relação com o abuso de uma aluna pode levar o leitor a interpretar que ao ser acusada de racismo, em um abuso moral, a professora se provou culpada com sua declaração. Ao passo em que a matéria expõe: “A professora de uma escola de Humble, no Texas, Estados Unidos, fez uma forte declaração para se defender de uma acusação de abuso sexual de uma aluna. Esther Irene Stokes, de 61 anos, disse que não poderia ter tocado as partes íntimas de uma garota de sete anos cuja mãe alega ter sido abusada na classe porque não gosta de alunos negros”. Foi feita a escolha de privilegiar o valor-notícia de “polêmica”, ao trazer um escândalo no subsetor “Educação” do site. Ainda podemos perceber que em nenhum momento a chamada faz alusão ao fato ter ocorrido nos Estados Unidos. O leitor pode se atrair à notícia pensando que esse é mais um dos inúmeros casos recentes de abusos (seja sexual ou moral, e por parte de professores ou alunos) em instituições de ensino brasileiras.

            No campo das “Mais lidas”, encontraram-se algumas construções cujos títulos sugeriram algumas relações causais inexistentes. Na manhã de 14 de abril (domingo), por exemplo, a redação do título da notícia “Fora do jogo do São Paulo, Ganso detona operadora de TV”, sugere algum nexo existente entre a ausência do jogador Ganso do jogo do time São Paulo e a contenda com a empresa prestadora de serviços. Contudo, o texto da matéria focou-se menos na situação ocupada pelo jogador durante a disputa futebolística que a verberação contrária à empresa telefônica verbalizada via Twitter. Destaca-se, por exemplo, o seguinte excerto da matéria: “Poupado do jogo contra o XV de Piracicaba neste sábado (13), pelo Paulistão, para estar 100 % no duelo contra o Atlético–MG, pela Libertadores, o meia Paulo Henrique Ganso tentou assistir os seus companheiros no conforto do lar, pela TV, mas não conseguiu. Uma falha na transmissão da operadora NET impediu Ganso de torcer pelo Tricolor do Murumbi, e o meia detonou a empresa através das redes sociais. ‘Obrigado a Net por me deixar sem assistir ao jogo do São Paulo. 1h no telefone e só escuto um momento por favor e desligam a chamada”. Assim, conquanto tenham trabalhado com o valor de notícia “personalização” e privilegiado a abordagem de um episódio da esfera privada do jogador Ganso, o portal R7 utilizou-se de um elemento de sua vida pública e profissional – a atuação no time São Paulo – como elemento principal para atrair os leitores para a notícia. Nesse sentido, considerando-se o dia, a hora e o setor em que a notícia foi publicada – domingo pela manhã, futebol – é possível pensar que grande parte dos leitores tenha lido o texto buscando informações sobre o jogador e o seu time, e não para apreender aspectos de sua vida pessoal.

 


            No dia 20 de abril (sábado), às 11h da manhã, há outra matéria da seção de Esportes entre as “Mais lidas”. Seu título é “Apressado, Verdão desembarca sob pedido de ‘atropelamento’ a Tijuana”. A presença das palavras “apressado” e “atropelamento” na mesma frase pode levar à interpretação de que o Verdão esteve envolvido em alguma situação no trânsito, ou até mesmo em uma pista de pouso, já que a palavra “desembarca” indica um cenário aéreo. O texto da matéria aponta que “A passagem do Palmeiras pelo aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, na noite desta sexta-feira foi rápida, mas suficiente para ouvir dos poucos torcedores presentes um pedido que demonstra até confiança no time para a sequência na Libertadores. Logo depois de conceder entrevistas, Gilson Kleina ouviu um grito de um palmeirense, que pediu: ‘Vamos atropelar esse Tijuana, hein, Kleina!’. O técnico prosseguiu tranquilamente entre seguranças sua caminhada até o ônibus, ciente de sua missão nas oitavas de final no principal torneio das Américas.” Para compreender o real significado proposto no título, era preciso que o leitor soubesse que “Verdão” era referência ao time do Palmeiras, que “Tijuana” era um time adversário que o Palmeiras enfrentaria em algum torneio e que “atropelar” é um jargão futebolístico que indica “vencer, passando por cima do adversário”. A matéria ainda discorre sobre a relação do técnico do Palmeiras com os torcedores e sobre uma confusão ocorrida em um desembarque anterior da delegação palmeirense. O “atropelamento” foi uma forma encontrada pelo redator para costurar os dois assuntos, mas não é esse o foco da notícia. Ainda assim, essa informação é privilegiada na chamada, reforçando o valor-notícia de entretenimento e curiosidade. 




 

Durante a análise dos títulos e textos das matérias do R7, percebemos que as sessões “Fotos” e “Moda e Beleza” eram aquelas em que as disjunções entre os conteúdos daqueles e desses eram mais tênues. Nesse sentido, na noite do dia 16 de abril (terça-feira), destacou-se a matéria “Você nem imaginava, mas elas têm o corpão sarado! Veja as famosas que escondem belas curvas”. Pertencente à sessão “Fotos” - parte integrante do conteúdo de entretenimento do portal -, a notícia ocupava, simultaneamente, o campo dos “Destaques” e das “Mais lidas”. O texto trazia fotos de diversas celebridades, como Adriana Esteves e Patrícia Poeta, acompanhadas de legendas cujo conteúdo apresenta estritamente comentários acerca da forma física dessas famosas. Destaca-se, por exemplo, uma foto de Adriana Esteves, cujo texto “Aos 43 anos, Adriana Esteves está magrinha e como tudo no lugar. Olha só a barriga chapada dela” corresponde à proposta levantada pelo título. Marcada principalmente pelos valores-notíciada visualidade e da personalização, esse tipo de construção é recorrente no Portal R7 e foi empregada, de forma semelhante, em uma das notícias “Mais lidas” do dia 14 de abril (domingo), pela amanhã.  Pertencente à sessão “Moda e Beleza”, a notícia “Isis Valverde radicaliza e exibe cabelo curtíssimo” empregou como recurso o uso de algumas imagens do novo visual da atriz global e apresentou somente uma informação não explícita no título: “A atriz também mudou a cor das madeixas”. Em ambos os casos, é possível afirmar que o emprego de imagens que comprovam aquilo expresso pelo portal atua como instrumentos verossímeis que arrefecem alterações no título e no conteúdo das matérias.




            Não obstante, o uso da exploração imagética pelo portal R7 resultou, também, na redação de noticias superficiais marcadaspor uma apuração rasa e carentes de problematização. No dia 19 de abril (sexta-feira), pela manhã, a notícia “Entenda por que as famosas mudam de comportamento após pousarem nuas”, era um dos “Destaques” apresentados pelo portal e construiu-se com alto grau de disjunção em relação ao título. Nesse sentido, o conteúdo da matéria era formado por algumas fotos de celebridades na época que participaram dos ensaios para revistas masculinas e fotos de momentos posteriores. Marcado pelos valores-notícias principais da “visualidade” e “personalização”, o texto estruturou-se, muitas vezes, em comentários a respeito da aparência das celebridades e não, necessariamente, sobre o seu comportamento. No caso de Bárbara Evans, por exemplo, a notícia discorre: “Bárbara Evans foi lançada à fama após pousar nua, mas mudou seu corpo completamente depois do ensaio. A psicóloga Marisa explica que muitos sentimentos negativos podem surgir após uma grande exposição acompanhada de críticas”. Assim, não há abordagem sobre aspectos temperamentais que poderia ter sido alterados como consequência do ensaio para a mídia – temor de exibição pública, desenvolvimento de distúrbios alimentares, indícios de depressão, entre outros-, apenas aspectos da mudança da aparência dessas mulheres.


            Na tarde do dia 19 de abril (sexta-feira), às 17, a matéria “Galã vai ganhar indenização de R$ 160 mil” ocupava o primeiro lugar no campo de “Mais Lidas”. É comum observarmos a utilização de descrições como “galã”, “pivô da separação”, “musa”, entre outras, para substituir o nome de alguma celebridade. Nesse caso, a personalidade em questão era Fábio Assunção, que receberia a indenização por conta da invasão de uma fotógrafa em seu casamento. É possível identificar quem é o galã por conta do recurso imagético empregado, uma foto do ator. Mas em uma seção de celebridades, poderia se imaginar que seria válido utilizar o nome da personalidade diretamente no título, já que se trata de alguém conhecido. A opção de utilizar descrições genéricas pode ser explicada pelo fato do redator tentar atiçar a curiosidade do leitor para saber a qual “galã”, “musa”, “herdeira”, o título remete. A matéria em si condiz com o título escolhido, e traz apenas informações sobre a indenização, sem levar a nenhum outro assunto, tendo como principal valor-notícia o “entretenimento”.

 
Às 8h20 da manhã do dia 22 de abril (segunda-feira), o campo de “Destaques” trazia mais uma notícia da editoria de Entretenimento com foco em celebridades. Seu título é “Cantor Zezé de Camargo fala sobre ter desafinado ao vivo na televisão”. Esse é um dos casos no qual a chamada mais condiz com o texto da matéria, visto que ela discorre sobre como o cantor reagiu às críticas por ter desafinado em uma apresentação ao vivo. Nesse caso, o cantor já é discriminado na chamada, atraindo especificamente os leitores que querem saber mais sobre a vida dele ou sobre aquela situação específica, e não leitores curiosos para saber qual foi o cantor que desafinou ao vivo. Apesar de observarmos com frequência em diversos veículos o uso de sensacionalismo em chamadas envolvendo celebridades, nessa seção do R7, as matérias que se propunham a explorar um fato pontual e específico foram aquelas que apresentaram títulos mais claros e fieis ao conteúdo presente no texto.

Por Laís Ferreira e Amanda Almeida

Um comentário:

  1. Muito interessante essa análise da "dramatização" da matéria do garoto Luka. Eu vi essa matéria primeiro no site "Hypeness" e é até engraçado observar que lá eles colocaram já no título da matéria de que se tratava de um ensaio fotográfico, completamente diferente do R7.

    Em relação a essas mais lidas, já me deparei com várias outras que não parecem ter muita conexão entre o título e o conteúdo. A maioria das vezes são notícias relacionadas ao esporte. É decepcionante!

    ResponderExcluir