Luísa Teixeira, Nina Rocha e Thaiane Bueno
As revistas Nova e TPM destoam-se logo nas capas do mês de Março. Enquanto a capa da TPM é construída em tons claros e pastéis, a Nova é bem mais vibrante, predominando a cor vermelha tanto no plano de fundo da fotografia quanto na roupa usada pela modelo. Quanto as personagens escolhidas para serem o foco principal das capas, temos duas mulheres que nos últimos meses estão evidenciadas pela mídia, ainda que sejam focos diferentes. Quem figura a capa da revista Nova é a atriz global Giovana Antonelli, que passa por um bom momento de sua carreira interpretando a personagem Heloísa na atual novela "Salve Jorge". A TPM apresenta a atriz, cantora e roterista Clarice Falcão, popular na Internet por participar do canal humorístico no Youtube "Porta dos Fundos" e pelos vídeos onde canta músicas de sua autoria. Além de possuírem perfis diferentes, a diferença entre as atrizes - e, consequentemente também as capas-, ficam transpostas no figuro utilizado para as fotos. Giovana Antonelli ressalta a imagem de "mulherão", bem produzida e maquiada com decote e pernas à mostra, e apesar de todo o seu destaque na capa, a chamada para a sua entrevista é a mais discreta de todas.
A foto de Clarice Falcão é mais descontraída e natural e dialoga com o assunto da edição - como foi abordado no último relatório, as edições da TPM são temáticas: a principal matéria da revista é "Pra que trabalhar que nem homem?" e Clarice na foto está segurando uma caneca de bigode. É interessante também observar o papel masculino na construção das capas. A TPM evoca o "homem" apenas em duas situações: para ressaltar as conquistas da mulher no mercado de trabalho e na chamada para o ensaio sensual de Shogun, lutador do UFC. Já na Revista NOVA opinião masculina aparenta ser bem mais relevante:, "Amor à prova de crise para ler com ele", "Sim, ele está afim de você" e "Makes que os homens amam". A maquiagem e o cuidado com a beleza é abordada na TPM apenas com a chamada Hora extra? Aprenda a disfarçar as olheiras, enquanto na NOVA ainda há o enunciado "Cabelão já". Além das personagens centrais, ainda na capa, a TPM anuncia outras figuras presentes na revista, como a advogada Marina Belisário, a repórter Nina Lemos e a ministra do trabalho Delaíde Antunes. A Nova aborda também dicas para que sua leitora fique magra e uma pequisa sobre preferências sexuais. Além das chamadas temáticas e o já citados ensaio com Shogun e dica de maquiagem, a TPM também traz uma chamada referente à moda.
Comparação Editorial
Outro aspecto das revistas escolhido para ser abordado é o editorial. A TPM traz o título "Faça amor, não faça hora extra", enquanto a Nova diz "Você em seu melhor papel". A primeira começa com a chamada "Você não precisa trabalhar que nem homem: para que se conformar com tão pouco?". Em seguida, expões uma série de dados comparando o trabalho dos dois. Nas tarefas domésticas, elas ficam com 26,6 horas semanais, enquanto eles ficam com 10,5. Elas recebem 30% a menos para ocupar cargos equivalentes aos dos homens e apenas 20% dos cargos de chefias são ocupados por mulheres.
No fim, uma justificativa simples é apontada: elas não colocam a carreira como prioridade absoluta na vida. " As malucas teimam em perder tempo com filhos, família, amigos, saúde, lazer e outros detalhes desimportantes, e aí adeus promoção." E isso não é ruim. Talvez seja um exemplo que os homens devam seguir. O modelo de trabalho masculino ainda é assustador e repressivo, não só para as mulheres. Ainda é preciso lutar para mudá-lo e para que as condições de trabalho para homens e mulheres sejam igualadas.
Um dos pontos mais fortes do editorial da revista Tpm é que ele foi escrito por um homem: Fernando Luna, diretor editorial da publicação. Com isso, ele oferece às leitoras uma leitura diferente daquela que se espera quando a questão de gêneros envolvendo o trabalho vem à tona. Ele não defende as práticas machistas que dominam o mercado, ao contrário. Luna é sarcástico e questiona vários padrões que ele afirma existir na sociedade. Logo depois da constatação da divisão desigual das tarefas domésticas, ele abre um parênteses que se fosse dito por uma mulher poderia soar preconceituoso. “Dez horas e meia?! Três para lavar o carro, cinco para preparar o churrasco, duas arrumando os CDs e meia hora para enxaguar a própria escova de dentes após o devido uso. Bom, é só um parêntesis sem base estatística nem valor científico”. Como ele assume esta postura, o comentário é leve, ainda que carregado de conceitos que fazem referência à luta pela igualdade dos gêneros. Igualdade, neste caso, defendida “de cima pra baixo”
Pelo texto é possível inferir que normalmente essa luta é feminina. Elas querem se igualar aos homens, como sustenta o comentário da diretora de operações do Facebook, Sheryl Sandberg: ”ao contrário dos homens , [as mulheres] não colocam suas carreiras como prioridade absoluta de vida” Talvez o problema resida aí. “Justamente por se importarem com o que acontece além do expediente, as mulheres podem não apenas ocupar seu espaço nos negócios, mas transformar nossa relação com o trabalho. Transformar o trabalho”. E a verdade é que isto traz benefícios para ambos os lados. “Faça amor, não faça hora extra”.
O editorial marca bem o que a edição de abril traz para as leitoras da revista. A Tpm oferece à elas o acesso aos dois lados da questão, ainda que seja possível observar com clareza o posicionamento editorial da publicação.
Em contrapartida, a Nova chega com um discurso de que agora há um movimento de calmaria e que a causa do momento é não abraçar uma causa. No editorial, a diretora de redação da revista afirma que hoje as mulheres dispensam o título de wonder woman, que está "totalmente fora de moda, após provarmos que damos conta de tudo e mais um pouco". Podemos até dar conta de tudo, mas como vimos no editorial da TPM, a desigualdade entre os gêneros ainda impera. Enquanto a TPM incita a luta pela igualdade, a Nova reforça a ideia de que está tudo como deveria ser. E isto inclui todo um sistema machista que rege as relações de trabalho. Basta ser natural, espontânea e tentar ser a melhor versão de si mesma. Agir sem se preocupar com os julgamentos é importante, mas não significa que não devamos abraçar uma causa.
A revista da Editora abril também defende que devemos ser autênticas: "Responda rápido, com o máximo de sinceridade: você é um retrato fiel da imagem que passa para os outros? Se considera uma pessoa autêntica, que age e fala de acordo com o que pensa? Ou às vezes se sente uma ‘farsa’ ou que está representando um personagem? Esse é o maior desafio da mulher moderna." Mesmo defendendo os defeitos e excentricidades de suas leitoras, a revista confere uma classificação que não oferece à elas uma outra possibilidade àquela ditada em seu editorial.
Logo acima do editorial está a foto da diretora de redação que escreveu o texto: Monica Gailewitch. Loira, cabelos ao vento, blusa de paêtes. A imagem do sucesso. Com a receita do sucesso: você em seu melhor papel.
Sermos nós mesmas e abandonar as máscaras é o nosso maior desafio. Ao mesmo tempo, ao lado do texto, a revista traz um quadro chamando a leitora para acessar o site e copiar o cabelo da atriz Giovanna Antonelli. No decorrer de toda a publicação vemos como um padrão de beleza é reforçado mais e mais. Devemos ser autênticas ou devemos seguir o padrão de beleza representado ali? No fim das contas, faltou um pouco de coerência.
A publicação defende, em seu editorial, que “poder viver intensamente sem culpa as 79 personalidades, muitas vezes contraditórias, que habitam em cada uma de nós” é, talvez, o sonho de qualquer mulher. Ao dizer isso, ela se opõe drasticamente às reportagens “Você Posta Sempre Aqui” e “Contrato sem Risco”. Se as mulheres estão vivendo um momento histórico que preza a autenticidade e a naturalidade de suas ações, por que manuais de conduta ainda são publicados no decorrer da revista? Reportagens que pregam “Nunca mande o primeiro SMS” e “ não divulguem a vida de vocês no Facebook”, por exemplo, vão totalmente contra o que prega, em uma das sessões mais importantes de um veículo impresso: seu editorial. É ali que todos os princípios defendidos pela publicação são validados, na palavra de uma das figuras mais importantes da redação: o diretor editorial ou de redação.
Nova se contradiz ao ser analisada em uma única edição. Talvez isso tenha a ver com o que prega: seja autêntica, assuma seus defeitos. Defeito neste caso que ameaça a própria credibilidade da revista.
é interessante notar como revistas apresentam claramente um público para o qual se direcionam. Talvez seja o produto que mais delimite seus leitores. Lendo o post de vocês, vejo que, ainda que as duas revistas sejam destinadas ao público feminino, se voltam para perfis diferentes de mulheres.
ResponderExcluirA linguagem utilizada para isso, bem como o projeto editorial seguido, restringem o interesse dos leitores das revistas em questão.
Foi o que chamou minha atenção ao ler as análises de vocês!
Eu adorei esta análise. É claro que algumas diferenças, principalmente as capas, são bem evidentes. Mas vocês apontaram certos detalhes que muitas vezes passava batido ao ler essas revistas.
ResponderExcluirE mais interessante ainda é a irônica situação da reportagem machista (pelo menos ao meu ver) ser escrita por uma mulher, enquanto a outra, em contra partida, ser escrita por um homem.
Muito bom o trabalho de vocês
O texto e as comparações de vocês fazem muito sentido. Só não acho se a Nova pode ser tão julgada por suas "contradições". Ela é feita para um segmento de público que demanda textos e ideias de uma mulher pós-moderna que tenta conciliar beleza, amor e felicidade. A publicação parece estar recheada de fórmulas mágicas para a mulher que quer ser tudo isso. Porém, a revista, como nenhuma outra, é capaz de resolver os problemas femininos de forma prática. Já a TPM é claramente uma revista que quer desmistificar esses inúmeros papéis que nós tentamos conciliar. As capas ilustram bem as diferenças e vocês mostraram isso de maneira completa. Parabéns.
ResponderExcluirAchei a análise completa e verdadeira. Pequenos detalhes, como a foto da diretora de redação e a chamada para copiar o cabelo de uma atriz fazem muita diferença nessa divergência de públicos, e vocês destacaram muito bem isso.
ResponderExcluirGostei muito da postagem.
Gostei bastante da análise, pois aprofunda o debate da questão da mulher e suscita uma serie de reflexões. Quanto à revista Nova estou de pleno acordo. Só problematizaria uma questão: até que ponto esse enfoque da TPM na matéria sobre trabalho também não apresenta uma defesa velada do que está estabelecido. Enquanto os homens trabalham as mulheres ficam com os encargos domésticos e o cuidado com os filhos. Até que ponto isso é uma opção por amor ou um fardo. Por que a escolha de ter um filho implica necessariamente na renuncia a uma vida profissional ativa, bem sucedida e com promoções. Essa linha de pensamento não é confortável, em especial, para os homens? Não seria o caso de abordar a necessidade de direitos sociais que permitam as mulheres se dedicarem ao estudo e ao trabalho de maneira tranquila, sem perder o amor por seus familiares, mas sem também ter que ser responsabilizada pelos trabalhos de cuidados individualmente?
ResponderExcluirO mais impressionante das duas capas é que, enquanto na Nova a presença do homem e a necessidade de averiguação masculina são recorrentes em todas as chamadas, na TPM, o único momento no qual há um personagem masculino é em um ensaio sensual. Parabéns pelo relatório.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirMeninas, adorei o relatório! Ficou bastante claro como as duas revistas se diferem em termos de conteúdo e editorial. E um dos aspectos mais interessantes, pelo menos pra mim, é que, mesmo a TPM sendo bastante diferente da NOVA, ela ainda apresenta algumas categorias semelhantes, como alguns ensaios de moda e colunas sobre produtos de beleza. Mensalmente ambas apresentam produtos e cosméticos indicados por alguém. Talvez fosse interessante observar como as duas fazem isso, se chega a serem duas formas distintas ou não. Quanto à problematização comentada pela Natália, eu acho importante, porém, se você ver a revista inteira percebe que a problematização está em grande parte dela. Como a TPM apresenta um tema único a cada mês, aparece todo o tipo de opinião dentro do mesmo assunto. Nessa edição teve ponto de vista de quem trocou o trabalho pela carreira, o contrário, de quem concilia os dois e sofre e de quem concilia os dois e tem o apoio do parceiro.
ResponderExcluirPor fim, talvez fosse interessante vocês compararem o Manifesto TPM (http://revistatpm.uol.com.br/manifesto/index.php) com as capas e matérias da NOVA. É só uma dica, mas, apenas batendo o olho,eu já percebi um tanto de contraste.
E, ah, vocês sabem porque eles escolheram um editor masculino? Talvez fosse legal tentar um contato com o Luna.Parabéns pelo relatório!
Oi meninas! Acho que dá pra notar cada vez mais a discrepância entre as duas revistas, né? Achei muito legal a análise dos dois editoriais. O conformismo da Nova quanto ao papel da mulher (que acho que nunca vai parar de mudar e evoluir) não é bacana e mostra o distanciamento da posição assumida pelo editorial da TPM. Uma curiosidade: Vocês já pararam para reparar nos anunciantes de cada revista? Seria interessante saber quais são as diferenças nesse quesito.
ResponderExcluirPs.: Essa capa da TPM com a Clarice está muito fofa! haha :)
Continuarei assídua na caixinha de comentários de vocês!
Gente, curti muito o relatório de vocês. Acho que deu pra destrinchar bem as ideias que cada uma transmite e o perfil de mulher a que elas se destinam, como a Mel disse lá em cima. Achei os argumentos de vocês muito coerentes e incisivos, muito boa análise. Só queria sugerir que vocês buscassem hierarquizar melhor as informações no texto, me senti um pouco confusa em algumas partes. Também considero que ao usar um nome de matéria para justificar uma crítica/análise, você deve apresentar a contradição presente na matéria. Como há muita informação pra ser transmitida, às vezes realmente fica difícil da gente organizar. Foi só uma dica mesmo, para que a gente possa aproveitar mais do material que vocês estão analisando.
ResponderExcluirO tema do projeto de vocês é bem legal e estava até rindo aqui sobre a enorme diferença da capa das duas revistas (tanto nas chamadas, quanto na escolha das 'modelos'). O bacana do editorial da TPM ter sido escrito por um homem é que dá para comparar com as opiniões masculinas que a Nova vive "pedindo", o que mostra novamente uma grande diferença entre as publicações.
ResponderExcluirMeninas, muito boa a postagem. Essa capa da TPM com a Falcão, ao meu ver, é uma das mais pontais sobre as diferenças em relação à revista nova, deixando muito explicita essa divergência entre as duas. Gostei muito da análise,principalmente, assim como a Deborah, dos aspectos que normalmente passam despercebidos a maioria dos leitores, como as cores da capa e iluminação.
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