1 - Impressões sobre a visita
Amanda:
Antes de chegar à redação do R7 MG, eu já sabia que ela
seria pequena, mas acabou sendo ainda menor do que eu imaginava. São seis
pessoas trabalhando: uma editora-chefe- Flávia Martins y Miguel, com quem
conversamos -, quatro redatores e um estagiário; e pelo que nos foi falado,
nunca ficam mais do que quatro pessoas lá ao mesmo tempo. A última pergunta que
fiz na visita foi se eles tinham um fotógrafo para cobrir as pautas do site, e
Flávia me respondeu que não, “aqui é geração 2.0”, nas palavras dela. Por
mais que a gente queira ser bom, não dá pra ser um excelente repórter, redator,
editor a ainda por cima fotógrafo, tudo junto, ao mesmo tempo. Sempre se é
melhor numa área e deficiente em
outra. Acho que essa situação específica, essa necessidade de
que o profissional sozinho exerça quase todas essas competências, é muito
sintomática do cenário do Jornalismo hoje. Dava pra fazer um post inteiro
refletindo só sobre isso, mas aí já é outra história.
Como a visita foi realizada poucos dias depois do final da
primeira análise dos títulos do portal, eu já tinha uma ideia do que esperava
ouvir a respeito disso, e foi tudo confirmado. Sobre os outros aspectos do
site, me surpreendi bastante com o fato de, na análise deles, o R7 é o portal
mais presente nas redes sociais. Pelo menos nos meus ciclos, se eu precisasse
ranquear os três que mais aparecem no meu Twitter e Facebook, a ordem seria G1,
Terra e Yahoo.
Flávia também nos passou a informação de que o portal é o 3º
mais acessado do Brasil, o que é impressionante, se pensarmos que ele foi
criado a menos de quatro anos (em setembro de 2009). Mas enfim, é de internet o
que estamos falando, e a dinâmica da consolidação do portal é muito diferente
daquela necessária para um jornal impresso, por exemplo.
Chegamos mais cedo e ficamos na redação até que Flávia
chegasse, e nesse meio tempo, me pareceu que o convívio no local parece ser bem
harmonioso. Os dois redatores presentes no momento pareciam bem simpáticos,
comentavam as notícias com piadinhas e tudo mais. O que nos recebeu ficou bem
surpreso quando descobriu que poderíamos escolher trabalhar com o que
quiséssemos nessa disciplina e escolhemos o R7. Quase como “Com tanta coisa
melhor pra vocês analisarem, sério que escolheram logo o R7?”. Mesmo com boas
relações de trabalho, parece que não há um sentimento de pertencimento.
Laís:
Tendo em vista a nossa visita ao R7, percebi o quão curiosa
é a relação do espaço físico de uma redação jornalística com o conteúdo por ela
publicado. Nesse sentido, uma das frases
mais significativas expressas pela chefe de redação, Flávia Martins, fornece
subsídio para essa análise: “É preciso desburocratizar a linguagem”.
Referindo-se ao perfil editorial do portal de notícias da
Record, Martins afirmou: “Aqui a gente não adquire, a gente compra”. Partindo
da premissa que o perfil dos leitores do R7 é formado predominantemente pelo
público da classe C e D – e preconizando sê-lo detentor de vocabulário reduzido
-, a fala de Martins é condizente com o espaço físico reduzido e com a equipe
pequena de apenas seis membros do portal. Na estreita sala da redação, não são
visíveis elementos de consulta – livros e revistas impressas – e tampouco
aparelhos televisivos e radiofônicos que possam ser usados como ferramentas
para consulta e obtenção de informação por parte dos redatores.
Penso, porém, que o objetivo de desburocratizar a linguagem,
almejado pelo R7, pode ser mais complicado que aquilo previsto pelo portal. A
disjunção encontrada entre o sentido dos títulos e do sentido do texto –
objetivo central do nosso projetos B1 – é um exemplo claro dessa realidade.
Segundo a própria Martins, o título da matéria corresponde ao elemento mais
importante do conteúdo publicado pelo portal. Tendo por objetivo atrair os
leitores para a tríade que é vista como tripé do R7 – factual, serviços e
audiências – o título das matérias segue uma linha sempre próxima ao
sensacionalismo. Isso pode ser notado nas matérias concebidas como destaques
pelo portal, as quais, segundo Martins, priorizam temas como polícia, sexo e
sangue. De acordo com a editora, utilizam-se, nesse processo, materiais
provenientes de outros segmentos da Record, como fragmentos do programa
televisivo “Cidade Alerta”.
Não obstante, de acordo com Martins, o portal R7 apresenta
total independência gestora e criativa dentro da Rede Record. Contudo, há uma
grande subordinação da unidade mineira à sede, em São Paulo. Nesse
contexto, conquanto a própria Flávia Martins reconheça a grande importância das
redes sociais para o funcionamento do portal, é somente a central de São Paulo
o núcleo responsável por gerenciar o conteúdo disponibilizado nas redes
sociais. Outras instâncias relativas à
influência da central paulista no funcionamento da gestão mineira são as
reuniões de pauta e os estudos relativos ao fluxo de leitores do portal. No
primeiro caso, realizam-se reuniões virtuais às segundas-feiras e, nos segundo,
são desenvolvidas pesquisas focadas na análise dos links mais acessados pelos
leitores e quais são os horários do dia em que há maior fluxo de visitantes.
Questionada acerca dessas estatísticas, Martins afirmou trataram-se de arquivos
sigilosos e não passíveis de serem compartilhados.
Particularmente, em relação à equipe do R7, notei dois fatos
pouco harmoniosos. Durante os trinta minutos que permanecemos esperando Flávia
Martins aparecer, nenhum dos outros dois jornalistas sentiu-se confortável o
suficiente para responder questões básicas sobre o portal e recomendaram-nos
que esperássemos Martins. Além disso, houve uma grande surpresa por parte de um
dos jornalistas da redação pela nossa escolha de adotar o portal como objeto de
nossa pesquisa. Nesse sentido, questionaram-nos, com ironia, se gostávamos
desse estilo de jornalismo. Consequentemente, reverto essa questão e
pergunto-me se os membros da equipe apreciam a linha editorial sob a qual
trabalham.
2 – Produção para as classes C e D e o sensacionalismo
“O estilo nem por sombra corresponde a
um simples culto da forma, mas, muito longe disso, a uma particular concepção
da arte e, mais em geral,
a uma particular concepção da vida.”
De
autoria de Léon Tolstoi e utilizada pela jornalista Maria Gabriela como
abertura de sua entrevista com Amora Mautner – diretora da novela global
“Avenida Brasil” -, essa sentença dialoga com a percepção das representações
das classes C e D presentes em produtos midiáticos contemporâneos. Nesse
contexto, há variações na forma como veículos e empresas da imprensa empregam
formas de linguagem distintas – impressa, radiofônica e televisiva – a fim de
construir um perfil fidedigno de determinadas classes sociais. Presente na
novela “Avenida Brasil”, nos periódicos populares e no objeto de nossa
pesquisa, o Portal de Notícias R7, essa forma de representação sugere análises
em que se pode perceber a valorização da apuração por parte dos veículos.
Produzida pela
Rede Globo entre março e outubro de 2012, “Avenida Brasil” foi considerada uma
das novelas pioneiras a representar o cotidiano das classes suburbanas do país.
Segundo Mautner, “Eu tinha uma novela que trabalharia precisamente com a
realidade. Porque a gente ia falar do subúrbio. Os suburbanos são a classe que
mais assistem novela. É um subúrbio que consome. Um subúrbio que tem orgulho de
ser suburbano”. A percepção crítica de Mautner foi consolidada, principalmente,
com as estratégias de produção por ela adotadas. Durante o processo de montagem
da novela, a diretora - que se reconhece pertencente à classe média -,
percorreu subúrbios a fim de compreender o universo que representaria. Dentre
diversas contestações, Mautner observou o percurso sonoro ruidoso do local, em
que se confluem diversos sons provenientes de situações distintas. Essa valorização
da pesquisa, em conjunto com a defesa da televisão como um espaço para o
surgimento de direção com traços autorais, produziram uma telenovela
considerada verídica e um sucesso do público brasileiro. A partir do estudo de
“Avenida Brasil”, percebeu-se como se sobressai uma obra em que há uma
preocupação em se representar segmentos e classes sociais para além dos preconceitos
óbvios e se percebe como o produto midiático pode interferir na vida da classe
representada.
O uso de uma linguagem e um estilo
destinado a uma classe específica também podem ser identificados no jornalismo
popular. Segundo autores citados por Geélison Ferreira da Silva em sua tese
“Violência e imprensa em Minas Gerais: uma reprodução da sociedade dominante”,
o jornal popular “É um tipo de jornal geralmente barato, com poucas páginas,
grande publicidade, destinado ao publico de baixa renda e não possui venda por
assinatura”. (p.11) Nesse sentido, o jornal popular dedicar-se-ia às classes C
e D, mas não se atrelaria, necessariamente, ao sensacionalismo. De acordo com
Silva,
“O jornal popular não publicaria somente sexo e
violência, tentaria então
corresponder ao interesse do público, buscando
estar cada vez mais próximo dele, abrindo inclusive espaço para a participação
desse público diretamente no jornal. O jornal popular, através de técnicas
antigas, já presentes no melodrama e no folhetim, busca o envolvimento do
público, dá maior ênfase ao local, e busca oferecer entretenimento ao leitor. Pouco
trata de política ou assuntos mais abrangentes, normalmente narra fatos de
forma simples e curta, trazendo parte do ocorrido na manchete que nem sempre
retrata exatamente o que narra a matéria. O leitor popular normalmente se
interessa por violência, futebol, fofocas do mundo dos famosos, e
acontecimentos locais, rejeitando a economia, a política e fatos de interesse
nacionais ou mesmo globais. O jornal popular se contrapõe ao jornal de
referência ou sério, que tem compromisso com a informação, ele busca, em ultima
instância, entreter o leitor.” (p. 12)
O jornalismo popular altera a relação usual entre o jornalismo e leitor,
na medida em que há maior preocupação com o entretenimento do que,
necessariamente, com o papel de crítica social associado à prática
jornalística. Nesse sentido, utilizam-se termos favoráveis ao estabelecimento
de relações de proximidade e intimidade com os leitores. Em Belo Horizonte, o
jornalismo popular pode ser associado a dois periódicos impressos: o “Aqui” e o
“Super Notícias”. Não obstante, esses jornais, em muitas das matérias,
constroem-se sob os pilares do sensacionalismo, tendo em vista a opção por
fatos em que há recorrência de assassinatos e outras instâncias agressivas.
De acordo com a nossa visita ao R7 e
à entrevista realizada com a editora-chefe, o portal de Notícias da Record
seria um representante do jornalismo popular, voltado para a produção de informação
para as classes C e D. Nesse sentido, é possível encontrar algumas
correspondências com a conceituação proposta por Silva, na medida em que as
sessões de moda, beleza e fotos visam, predominantemente, o entretenimento do
leitor. Em muitas vezes, o entretenimento baseia-se em termos agressivos e
voltados para a zombaria de determinada classe de indivíduos ou gênero.
Destaca-se, por exemplo, a sessão abaixo, em que há a imagem de uma mulher
semelhante a um cavalo é considerada uma das principais imagens da semana.
No entanto, a
maioria dos produtos vinculados à plataforma R7 assemelha-se mais ao perfil
sensacionalista. De acordo com Geélison Ferreira da Silva,
“Sensacionalismo, como indica o termo, está
relacionado à sensacional. Significa dizer que reproduz sensação intensa, se
refere à sensação, desperta admiração, entusiasmo e sentimentos de forma geral.
(...) Tem-se uma valorização da emoção, em detrimento da informação, através de
exagero, deturpações, ambivalências semântico lingüística, exploração do
vulgar, do extraordinário e espetacular. Destaca o supérfluo e sugestivo. O
conteúdo dessa imprensa é geralmente sexo, sangue e escândalos. Serve para
atender a instintos imediatos do leitor, fazendo com que o mesmo se afaste da
realidade ao invés de se voltar para a mesma (ANGRIMANI, 1995).” (p.11).
Tendo em vista a maioria dos títulos
e manchetes analisadas por nós até então, torna-se evidente a aproximação do R7
com o perfil sensacionalista. Nesse sentido, as disjunções existentes entre os
títulos e o conteúdo das matérias corroboram o uso da deturpação da linguagem
como instrumento de um público leitor. Esse segmento não corresponde,
necessariamente, à classe C e D. Tomando referência o conceito de jornalismo
popular e mesmo um produto reconhecido como identitário dessa camada, é
possível pensar que não é somente a busca pelo bizarro, pelo inusitado e pelo
sangue os interesses dos indivíduos pertencentes às essas classes sociais.
Talvez, se os redatores do R7 fizessem mais apuração próximas às essas camadas
sociais e menos pelo universo cibernético, tal como realizou Mautner,
alcançariam uma concepção mais próxima as características múltiplas que estão
presentes em qualquer segmentação social.
3 - R7 Nacional e R7 Minas
Durante a visita, Flávia nos disse que não há reuniões de
pauta exclusivas do R7 Minas. Eles participam da reunião de pauta semanal da
sede do portal, em São Paulo, juntamente com todas as outras sucursais, através
de videoconferência. Enquanto na redação daqui trabalham seis funcionários, na
sede são mais de 140 pessoas, que segundo ela, em sua maioria saíram de grandes
veículos, como Folha de São Paulo, Estadão e outros, para começar o novo portal
da Record.
A ideia que nos foi passada é a de que há uma grande
integração entre a sede e as sucursais, o que, ao analisar os sites, parece não
ser tão verdadeira assim. Para começar, o próprio layout da home geral do R7 e
do R7 MG são bem distintos. Apesar do estilo de fonte e sombreamentos serem
iguais, por exemplo, a disposição dos elementos na página não carrega a mesma
identidade visual. A página do R7 MG é muito mais limpa e simples.
Sobre as redes sociais, não há páginas ou perfis exclusivos
das sucursais, fato que pode até indicar essa integração, mas talvez seria
válido que cada regional tivesse seus mecanismos de divulgação próprios,
atraindo leitores interessados especificamente nas notícias relacionadas a um
certo local.
Flávia ainda afirmou que o concorrente do R7 MG é o portal
G1 Minas, e não o EM.com, O Tempo, e sites de outros veículos locais. Podemos
perceber que a grande maioria das notícias presentes na página do R7 MG estão
relacionadas à Cidades/Gerais, o que não me faz acreditar muito naquela
afirmação. Se os portais dos outros jornais também trazem esse tipo de notícia,
como não seriam seus concorrentes?
Um dos pontos levantados por Flávia é que por focar em
Cidades, o portal regional do R7 concorre só com o G1 Minas, que também tem seu
foco voltado para essa editoria, enquanto os outros portais abordam Esportes,
por exemplo. Segundo ela, se um leitor quiser notícias sobre o Atlético Mineiro
ou o Cruzeiro, por exemplo, não as buscaria na sucursal, mas sim na home geral
do portal. Mas aí cabe outro questionamento: não seria mais prático que cada
sucursal cobrisse os times de sua região, ao invés de todos os times ficarem na
mão de quem muitas vezes está geograficamente distante, na sede em São Paulo?
Por fim, um dos únicos pontos que indicam uma integração
funcional e coerente é quando há demandas de matérias com um mesmo que partem
da sede para todas as sucursais, como acontece no caso de Eleições.
4 - Análise dos Títulos
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirAchei interessante vocês terem exposto as impressões individuais de cada uma sobre a visita ao R7, é uma forma até de mostrar possíveis diferentes compreensões do local e do que foi dito pelos jornalistas do portal. Achei curiosa a pergunta de um dos jornalistas relatada pela Laís, em que ele questiona o porquê da escolha do portal como objeto de análise da dupla. É claro que muitas vezes o bom jornalista precisa deixar seus gostos e até valores à parte buscando a imparcialidade, mas trabalhar em uma empresa em que você supostamente não acredita e não concorda com a proposta é no mínimo complicado. Quanto ao ranking que coloca o R7 como terceiro portal mais acessado no país, concordo com a Amanda, fiquei surpreso!
ResponderExcluirO post de vocês ficou muito bem feito e o relato claro e fundamentado, mas muito extenso, acho que dariam umas 3 postagens só com a divisão desse. Tirando esse detalhe, deu pra ver que vocês entraram de cabeça no projeto, partindo de um tema simples, mas que rendeu uma discussão muito rica! Talvez o desafio seja selecionar o conteúdo, fazer um recorte no texto final, mas tudo está muito coerente.
Gostei muito de vocês, muito bem embasado e argumentado. Também Achei bem legal terem colocado a visão de cada em relação à visita técnica.
ResponderExcluirIa, aliás, justamente comentar sobre os questionamentos dos motivos de vocês estarem estudando o R7, mas o Vitor disse tudo. Se nem os caras acreditam e confiam no que estão fazendo, é bem difícil que alguém o faça.
Ei gente!! gostei muito do segundo post. Queria saber de vocês se quando conversaram com a Flávia, ela chegou a comentar qual a média de matérias que a sede em BH produz por dia?
ResponderExcluirMuito bem articulado o post , quase não percebi o tamanho, surpreendente o relato, de vocês, dentre os pontos destacados o que mais me chamou a atenção foi , a descrença dos profissionais com o próprio trabalho,
ResponderExcluirfiquei pensando que talvez isso possa estar relacionado com a idealização que criamos em torno do trabalho do jornalista , e a incongruência com a realidade no campo.